sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

A grande contradição brasileira


Mais e mais cresce a convicção, inclusive entre os economistas seja do establisment seja da linha neokeynesiana, de que nos acercamos perigosamente dos limites físicos da Terra. Mesmo utilizando novas tecnologias, dificilmente poderemos levar avante o projeto do crescimento sem limites. A Terra não aguenta mais e somos forçados a trocar de rumo.

Economistas como Ladislau Dowbor entre nós, Ignace Sachs, Joan Alier, Herman Daly, Tim Jack e Peter Victor e bem antes Georgescu-Roegen, incorporam organicamente o momento ecológico no processo produtivo.

Especialmente o inglês T. Jack se celebrizou pelo livro “Prosperidade sem crescimento”(2009) e o canadense P. Victor pelo “Managing sem crescimento” (2008).

Ambos mostraram que o aumento da dívida para financiar o consumo privado e público (é o caso atual nos países ricos), exigindo mais energia e uso maior de bens e serviços naturais, não é de modo algum sustentável.

Os Prêmios Nobel como P. Krugman e J. Stiglitz, porque não incluem explicitamente em suas análises os limites da Terra, caem na armadilha de propor como saída para a crise atual um maior gasto público no pressuposto de que este produzirá crescimento econômico e maior consumo com os quais se pagarão mais à frente as astronômicas dívidas privadas e públicas.

Já dissemos à saciedade que um planeta finito não suporta um projeto desta natureza que pressupõe a infinitude dos bens e serviços. Esse dado já é assegurado.

O que Jack e Victor propõem é uma “prosperidade sem crescimento”. Nos países desenvolvidos o crescimento atingido já é suficiente para permitir o desabrochar das potencialidades humanas, nos limites possíveis do planeta. Então chega de crescimento.

O que se pode pretender é a “prosperidade” que significa mais qualidade de vida, de educação, de saúde, de cultura ecológica, de espiritualidade etc. Essa solução é racional mas pode provocar grande desemprego, problema que eles resolvem mal, apelando para uma renda universal básica e uma diminuição de horas de trabalho.

Não haverá nenhuma solução sem um prévio acerto de como vamos nos relacionar com a Terra, amigavelmente, e definir os padrões de consumo para que todos tenham o suficiente e o decente.

Para os países pobres e emergentes se inverte a equação. Precisa-se de “crescimento com prosperidade”. O crescimento é necessário para atender as demandas mínimas dos que estão na pobreza, na miséria e na exclusão social. É uma questão de justiça: assegurar a quantidade de bens e serviços indispensáveis.

Mas simultaneamente deve-se visar a prosperidade que tem a ver com a qualidade do crescimento. Há o risco real de que sejam vítimas da lógica do sistema que incita a consumir mais e mais, especialmente bens supérfluos.

Então acabam agravando os limites da Terra, coisa que se quer exatamente evitar. Estamos face a um angustiante círculo vicioso e não sabemos como fazê-lo virtuoso sem prejudicar a sustentabilidade da Terra viva.

A contradição vivida pelo Brasil é esta: urge crescer para realizar o que o governo petista fez: garantir os mínimos para que milhões pudessem comer e, por políticas sociais, serem inseridos na sociedade. Para as classes já atendidas, precisa-se cobrar menos crescimento e mais prosperidade: melhorar a qualidade do bem viver, da educação, das relações sociais menos desiguais e mais solidariedade a partir dos últimos.

Mas quem vai convencê-los se são violentamente cooptados pela propaganda que os incita ao consumo?

Ocorre que até agora os governos apenas fizeram políticas distributivas: repartiram desigualmente os recursos públicos. Primeiro garantem-se 140 bilhões de reais para o sistema financeiro a fim de pagar a dívida pública, depois para os grandes projetos e somente cerca de 60 bilhões para as imensas maiorias que só agora estão ascendendo.

Todos ganham mas de forma desigual. Tratar de forma desigual a iguais é grande injustiça. Nunca houve políticas redistributivas: tirar dos ricos (por meios legais) e repassar aos que mais precisam. Haveria equidade.

O mais grave é que com a obsessão do crescimento estamos minando a vitalidade da Terra. Precisamos de um crescimento mas com uma nova consciência ecológica que nos liberte da escravidão do prudutivismo e do consumismo.

Esse é o grande desafio para enfrentar a incômoda contradição brasileira.


Leonardo Boff é teólogo e filósofo e autor de "Sustentabilidade: o que é e o que não é", Vozes, Petrópolis 2012.

http://oglobo.globo.com/pais/noblat/post.asp?cod_post=432550&ch=n

domingo, 12 de fevereiro de 2012

Por que o Facebook funciona, e a democracia não!

Este ano, o Facebook atingirá a marca de 1 bilhão de usuários — ou um sétimo da população humana.  Isto significa que esta rede social induziu uma quantidade de participação popular maior do que qualquer outro governo no mundo, exceto Índia e China, e provavelmente irá superar estas duas nações dentro de um ano ou dois.  E enquanto várias pessoas ao redor do mundo fogem de seus governos tão logo se tornam capazes, cada vez mais pessoas se juntam voluntariamente ao Facebook.
Qual é a lógica?  Qual é a força motriz?  Qual é o agente da mudança?

Sim, o software funciona muito bem, e sim, os administradores e proprietários têm mentes empreendedoriais.  Porém, o real segredo do Facebook é a sua engrenagem humana interna — os usuários individuais —, a qual acaba sendo um espelho da maneira como a própria sociedade se forma e se desenvolve.

A melhor maneira de ver e compreender isto é comparando o funcionamento do Facebook com o funcionamento do processo político democrático.  Observar o progresso do Facebook é algo divertido, produtivo, fascinante, proveitoso e evolutivo.  Por outro lado, vivenciar um período eleitoral é sempre algo desagregador, fatigante, incômodo, inútil, destrutivo, amargo e completamente perturbador.

E é assim porque o Facebook e a democracia funcionam seguindo princípios completamente distintos.

O Facebook se baseia no princípio da liberdade de associação.  Você decide se associar a alguém ou a algum grupo, ou simplesmente se recusa a se associar.  Você pode ter um só amigo ou milhares de amigos.  Você compartilha as informações que quer compartilhar e mantém ocultas aquelas que você não quer que se tornem públicas.  Você utiliza a plataforma somente para seu proveito próprio, podendo se recusar a utilizá-la para qualquer outro propósito.

A contribuição que você dá ao Facebook é um prolongamento das coisas que você melhor conhece: você próprio, seus interesses, suas atividades, suas ideias.  O princípio do individualismo — você é o melhor gerente da sua vida — é a engrenagem que move a máquina.  Assim como não há duas pessoas iguais, também não há duas pessoas que terão exatamente a mesma experiência ao utilizarem a plataforma.  Todas as opções são personalizadas e individualizadas de acordo com os interesses e desejos de cada usuário.

Mas, é claro, você está interessado em outras pessoas também, e assim você solicita uma relação ou uma associação.  Se elas concordarem, vocês se conectam e formam algo mutuamente satisfatório.  Você escolhe quem incluir e quem excluir, gradualmente formando a sua própria e exclusiva rede de associações, a qual irá se basear em quaisquer critérios seletivos que você queira.  As redes crescem continuamente por meio destes princípios do individualismo e da escolha.  Trata-se de um processo cooperativo em constante evolução — exatamente aquele que Hans-Hermann Hoppe descreve como sendo a fundação da própria sociedade.

Já as eleições democráticas, por sua vez, aparentemente também dizem respeito a escolhas.  Porém, trata-se de uma escolha sobre quem irá controlar toda a plebe.  O resultado de uma eleição coloca todos os usuários sob a mesma personalização, sob a mesma configuração, independentemente de qual seja o desejo de cada indivíduo.  Você é obrigado a participar do sistema pelo simples fato de ter nascido dentro dele.  Claro, você pode decidir em quem votar, mas você não pode optar por não ter sua vida controlada pelo vencedor da eleição.

Dentro deste sistema democrático, você automaticamente ganha centenas de milhões de "amigos", queira você ou não.  Estes falsos "amigos" (ou "amigos" fakes) são designados para você em virtude de uma fronteira geográfica que foi delineada por líderes governamentais muitos anos atrás.  Estes "amigos" irão postar mensagem na sua página constantemente.  Seu 'feed de notícias' mostrará uma contínua e implacável série de exigências e obrigatoriedades.  Você não pode apagar estas postagens e nem marcá-las como spam.  As receitas do sistema não são obtidas por meio da publicidade, mas sim extraídas de você pelo simples fato de estar dentro do sistema.

Nada é realmente voluntário em uma eleição.  Independentemente do resultado, você estará vinculado a ele.  Se os eleitores forem majoritariamente jovens, o candidato A tende a vencer.  Se forem majoritariamente religiosos, o candidato B irá prevalecer.  Se forem majoritariamente lobistas ou membros de grupos de interesse, o candidato C será o vitorioso.  Tudo será decidido pela demografia, mas haverá apenas um vencedor sob este sistema.

Portanto, uma eleição tem necessariamente de ser uma batalha entre as pessoas, uma luta, uma briga incruenta, uma investida para impor a sua vontade e sobrepujar os interesses e desejos dos outros.  Ao final, os mestres apenas se voltam para nós e dizem que, não importa qual tenha sido o resultado, devemos estar todos felizes por termos podido participar do processo. O individual deve render-se ao coletivo.

Asseguram-nos que isso significa que o sistema funcionou.  Mas funcionou em que sentido?  Funcionou apenas no sentido de que a minoria bem-organizada levou a melhor sobre a maioria difusa.  Isso é tão pacífico quanto uma luta de vale-tudo.

Já o Facebook não tem nada a ver com este absurdo.  Suas comunidades são criações exclusivamente suas, uma extensão de suas vontades e da harmonia delas com as vontades alheias.  As comunidades crescem baseando-se no princípio da vantagem mútua.  Se você cometer um erro e adicionar uma pessoa indesejada, você pode esconder as postagem dela ou mesmo desfazer sua amizade com ela.  Isto irá gerar mágoas, é claro, mas não configura uma ação violenta: afinal, não se trata de roubo ou assassinato.

Seus amigos no Facebook podem ser de qualquer lugar do mundo.  Eles diariamente fazem "check in" em várias locações, registrando suas jornadas.  Não importa se o seu amigo mora em Pequim ou está em viagem para Buenos Aires; o Facebook torna possível aquilo que podemos chamar de associações humanas geograficamente não-contíguas.  Diferenças idiomáticas podem representar barreiras à comunicação, mas mesmo elas podem ser superadas.

Já a democracia está totalmente vinculada à geografia.  Você vota em uma localização especificada por uma instância superior.  Seu voto é amontoado junto aos votos de todas as outras pessoas que vivem em seu município, produzindo assim um resultado único para a sua localidade, desta forma fazendo com que seus reais desejos sejam instantaneamente fundidos aos desejos de todos estes outros indivíduos.  Ato contínuo, estes votos são novamente fundidos em um novo nível geográfico, desta vez estadual e, depois, finalmente, nacional.  Neste ponto, todas as suas preferências já se vaporizaram.

Algumas vezes, as pessoas enjoam do Facebook.  Elas repentinamente começam a considerá-lo tedioso, infantil, bobo, uma perda tempo.  Alguns passam a considerá-lo até mesmo invasivo.  Perfeito.  Você pode sair quando quiser.  Vá até suas configurações, desative todas as notificações e passe um período sabático.  As pessoas podem reclamar a sua ausência, mas trata-se da sua escolha estar ali ou não.  Você pode até deletar sua conta completamente sem nenhum inconveniente.  Depois você pode voltar caso deseje ou até mesmo entrar em outra rede social.

Agora, tente fazer isso na democracia.  Você não pode cancelar sua inscrição.  Você está automaticamente inscrito no sistema por toda a sua vida, e nem mesmo uma mudança de residência, até mesmo para outro país, pode mudar isso.  É extremamente difícil deletar a sua conta, mesmo renunciando à sua cidadania.  Os líderes da democracia ainda assim irão perseguir e acossar você.

Podemos aprender várias lições com o Facebook e com todas as outras redes sociais que a internet nos trouxe.  São mais do que simples websites; são modelos de organização social que transcendem as velhas formas.  Se a nossa vida se tornasse mais parecida com uma rede social, veríamos um real progresso no caminhar da civilização.  Se persistirmos no velho modelo de integração democrática forçada, continuaremos vivenciando nosso atual declínio.





Jeffrey Tucker
é o presidente da  Laissez-Faire Books e consultor editorial do mises.org.  É também autor dos livros It's a Jetsons World: Private Miracles and Public Crimes e Bourbon for Breakfast: Living Outside the Statist Quo


Tradução de Leandro Roque