quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Rituais de Passagem ... Artigo de @ToniFigo1945

Conta a história que a corrupção nasceu com a Humanidade. Não sei exatamente quantos anos Adão e Eva viveram felizes no Paraíso e aqui me lembrei daquele filme, que lançou a Brooke Shields, a LAGOA AZUL. Diz a Bíblia, que passeavam felizes, inocentes e inconscientes da sua nudez até que a “insidiosa” cobra mostrou a Eva o “fruto proibido”. Também não sei por quanto tempo Eva conseguiu manter segredo do seu contato reservado com a cobra, assim também como não sei exatamente que tipo de “fruto proibido” a cobra mostrou à Eva. Guardo severas desconfianças com relação a essa estória de que fosse uma maçã, pois como maçã regularmente, inclusive perambulando pelas ruas e nem por isso vejo maravilhosas e oferecidas  mulheres nuas transitando ao meu redor e nem meus olhos poupados de muito bagulho. A propósito, a conclusão é porque ainda diz a Bíblia, que após come-“la”, tornaram-se conscientes da sua vergonha e nudez. Foi exatamente nesse fato que se configurou o primeiro ato de corrupção da Humanidade e Deus com sua Justiça Divina, um conceito de difícil compreensão nos dias de hoje, “cassou-lhes” as mordomias paradisíacas e jogou-os e à sua descendência à própria sorte e pela primeira vez houve uma condenação por corrupção ativa e passiva, formação de quadrilha e pela teoria do domínio do fato.

Não vou transcorrer aqui sobre a compra de direitos primogênitos com uma sopa de lentilhas, negociações por trinta moedas e mais um sem contar de utilização do método, pois não vou reescrever o que já está escrito. Quero falar-lhes da minha percepção e experiência quanto ao hábito, acontecidas lá pelos idos de 1959, quando adolescente fui obrigado a começar a “ganhar o pão com o suor do meu rosto”, em meu primeiro emprego como “menor aprendiz”. Consistia de recolher correspondências bancárias e pagar contas em uma caminhada partindo da Praça da Sé, Rua 15 de Novembro, Boa Vista, Florêncio de Abreu e depois até a Praça da República e de volta à Barão de Paranapiacaba e isso com “hora marcada” entre às 09:00 hs e 11:00 hs da manhã, além da obrigação de ir ao bar da esquina buscar lanchinhos para os marmanjos do escritório e até mesmo entregar bilhetinhos amorosos desses mesmos marmanjos às moçoilas namoradeiras que se apresentavam nas janelas dos prédios vizinhos.

Comparar tempos, tecnologia e disponibilidade de informação é sempre muito revelador e renovador de conceitos no estudo dos relacionamentos humanos. Na década de 50 a quantidade de domicílios que contavam com aparelhos eletrodomésticos e de televisão, em especial, mesmo nas grandes metrópoles era mínima, pois mesmo a compra de um aparelho de rádio, equivalia à compra de uma televisão de tela plana nos dias de hoje. Mesmo os jornais eram seletivos e discriminativos mantendo uma relação qualidade de informação versus preço e à população mais pobre só eram acessíveis os “tabloides, que espremidos vertiam sangue”, entretanto o “jornalismo de opinião” vivia uma grande época, principalmente pelo final da II Grande Guerra, que decretou também o fim da Ditadura Vargas. À criança a única informação disponibilizada quanto aos “assuntos adultos”, principalmente os Políticos, eram as noções de Moral e Cívica nas quais se restringia à apresentação dos símbolos nacionais e o ensino de hinos. O Patriotismo era ensinado junto com as aulas de História do Brasil e Geografia.

Naqueles tempos um menino ao ser introduzido no mundo adulto através do trabalho, ainda com um pé no mundo infantil, sempre significava uma situação traumática e para quem não sabe ou se lembra, as crianças sempre eram mantidas à distância das conversas e reuniões adultas. “Vá brincar lá fora. Isto não é conversa para pirralhos”, diziam e à criança de treze ou catorze anos, que embora já se atrevesse aos namoricos de beijos roubados, uma nova brincadeira, ficava à distância imaginando o porquê do hermetismo daquele outro mundo. A inclusão em regime de subserviência só era admitida na obediência de ordens adultas, de qualquer adulto, do faça isso ou faça aquilo, vá aqui, vá ali. Esses mistérios tão insondáveis exclusivos dos “mais velhos”, com um misto de curiosidade e segregação nos incitavam a nos tornarmos adultos mais rapidamente. Quem há de se esquecer das primeiras calças compridas com cintos, da voz esganiçada em falsete e dos pelos pubianos, que prenunciavam uma mudança do menino para o rapaz, que rumava ao seu “primeiro dia” de trabalho?

Era assim ao ser introduzido nesse novo mundo que íamos fazer as descobertas por conta e risco próprios. Pouca ou nenhuma informação era dada à criança para essa transição. A pouca educação sexual era a do instinto ancestral velho conhecido nos “troca-troca” e campeonatos de “arco de mijo, de tamanho de piroca e de punhetas” entre a molecada e por isso muitos de tornaram vítimas de pedofilia. Os “direitos do adolescente” eram o “direito a direito nenhum” e em especial quanto ao “direito de opinião”. O jovem adolescente não era “integrado” nessa “nova sociedade” e sim “corrompido” e mesmo assim festejava a sua nova condição de adulto. Com os colegas de trabalho mais velhos, que riam e debochavam da nossa virgindade, descobríamos a “zona” na Praça Julio Mesquita e nas Ruas Aurora e Timbiras, aquelas das “trepadas de 10 cruzeiros”, com direito a gonorreia e “chatos” de brinde, o primeiro “porre de cachaça” nas festas de final de ano, debaixo das risadas de todos os “adultos” e também de suspeitar da troca de olhares entre o “chefe” e a “secretária gostosa”, de quem espiávamos as “calcinhas”. Era pagando com nosso salário as “diferenças de troco” dos caixas de banco, que aprendíamos a “desconfiar” da honestidade alheia e a exercitar a nossa própria desonestidade escondendo os excessos recebidos, os “pasteis não pagos” ao chinês e as passagens sonegadas nos ônibus e bondes sem roleta de então. Não existia ainda o “bullying”.

Um “comportamento democrático” herdado acaba por ser o transmitido, só que nossa geração resolveu, que isso tinha que mudar e não transmitiu o que julgou anacrônico, porém se omitiu em transmitir um “new behavior” e por isso seguiu-se um tempo de “excessiva liberdade” ou “libertinagem” contra todos os tabus. Fizemos a Revolução Sexual, não batizamos nossos filhos em uma religião, não coibimos suas exigências descabidas e tampouco permitimos que passassem pelos apertos, que passamos. Demos e permitimos a eles tudo o que gostaríamos de ter feito ou tido e eles rebeldemente tudo receberam, como se fossem “direitos ancestrais adquiridos”. Ensinamos lhes a “liberdade”, mas não a “responsabilidade”, que à duras penas aprendemos. Ao desobrigá-los do “trabalho adolescente” celebramos como se fosse a “abolição da escravatura”, pensando que se “estudassem” seriam melhores cidadãos. Erramos... Criamos uma geração amoral e a mais competitiva de todos os tempos, para a qual o acesso aos “melhores postos” ainda é uma questão de “seleção natural” pela melhor qualificação profissional. Esquecemo-nos dos ensinamentos de Filosofia. Vae victis... 

Mas desde nossos filhos muita coisa mudou e isto este “velho menor aprendiz”  aprendeu com um enteado de quinze anos já “pai menino” e viciado em drogas, (maconha e cocaína) através do seu comportamento e sua capacidade de iludir e mentir, quanto a sua maior adaptabilidade ao “estilo de vida” sobrevivente de hoje. Mostrou-me ele, que ainda que nessa idade, já conhecia muito mais da vida, que eu aos trinta anos, profissional formado e pai de um filho de 10 anos. Isso aconteceu há vinte e cinco anos atrás e fico imaginando “como e de que forma” esses jovens de hoje trocam, tem acesso e são capazes de digerir tanta informação. Somos capazes de evoluir e acompanhar a evolução dos tempos, mas nossas cabeças não são capazes de pensar no “tempo deles”. Somos analógicos. Eles digitais.

O que se percebe de mais evidente é um choque entre a ideologia da nossa geração com o pragmatismo desta que #vempraqrua. Os valores comportamentais que recebemos de nossos pais, bisavôs desta geração, hoje são chamados de “valores reacionários e burgueses” e, portanto, inadequados para o “progressismo atual”. E é isso que nos cobram. Como aplicar os “valores de ética e moral” em um mundo altamente competitivo, no qual tais valores podem significar uma “desvantagem competitiva”, pois poderá custar o “seu” desemprego, a “sua” faculdade, o “seu” lugar na fila, enfim a “autodefesa do eu”. Alguns, pacificamente exigem a Ética, não como “padrão de moralidade”, mas sim como “igualdade de condições” de competitividade, já outros, iconoclasticamente, “botam prá quebrar”, expondo o desejo íntimo coletivo de fazê-lo e quem diz que admitir isso é admitir a barbárie, que procure desde logo sua caverna de refúgio, porque nos “tempos de hoje”, quem não arranha não mama e é isso que eles querem dizer. Manipulados e financiados ou não.

Por que muitos jovens hoje não querem sair de “debaixo da asa” familiar ou após algum fracasso para lá retornam? Os preparamos mal ideológica, psicológica ou pragmaticamente? Não... Não podem nos culpar, pois afinal cada geração sempre teve que lutar para “conseguir seu espaço” e esta geração não foge à regra. Contudo, se eventualmente nos omitimos em algo ao “preparar o futuro”, ainda há tempo, pois se uma coisa esta geração sempre soube fazer foi “radicalizar e criar”, mostrando-lhes, que se a cultura latina sempre preparou para a guerra ou para a paz exclusivamente e não nos ensinou a “administrar conflitos” como uma fase intermediária e por isso, politicamente, nos preparou para sermos exclusivamente Poder, devemos lembrá-los, que o brasileiro não sabe ser Oposição. Da geração da “obediência cega” partimos direto para a da “desobediência cegante”. Esses são os “rituais de passagem” mutantes no tempo. Temos que cursar junto com eles esses “anos saltados” e aprender a reivindicar com energia, a protestar com razões consistentes, a acusar prudentemente e a punir coerentemente. Acima de tudo a exigir coletivamente olho no olho e dedo na cara aquilo que é nosso “direito cidadão”. Eles ficam com as “gatinhas” e nós agitamos as “bandeiras”...

Pense comigo ...


Antonio Figueiredo
@ToniFigo1945
Brasileiro, Construtivista e Ativista Federalismo Parlamentarista Unicameral c/Voto Distrital Puro.
Salvador-Bahia-Brazil

4 comentários:

  1. Uma brilhante análise e recordação, caro. Só teria a "corrigir" que somos tão digitais quanto eles...

    Nossos pais pensaram a mesmíssima coisa sobre nós, só não escreveram porque não tinham internet...

    E, por fim, se há algo que brasileiro sabe ser, esse algo é ser "oposição". Aprendemos isso quando D. Pedro I se deixou derrubar e nunca mais esquecemos...

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  2. Amigo,Graças a Deus que tive meus filhos há alguns anos,e eles já estão crescidinhos e, parece que são felizes,íntegros,trabalhadores,respeitadores do próximo,enfim, acho que são...normais!

    Deus me livre ter filhos nestes tempos de agora!
    Eu não saberia educar! Não saberia aceitar essas "liberdades",pois, parece que são mais libertinagens do que qualquer coisa!

    Cadê os valores de outrora? Morreram?
    Cadê os princípios que valeram em nossas vidas?
    Cadê a Ética,(que agora tem este nome, mas que engloba: honestidade,respeito,cortesia,sigilo,discreção,eenfim, valores que usávamos no dia a dia, com a maior naturalidade, pois isso era intrínseco na nossa formação/educação de berço!

    Onde foi parar isso tudo? Não se pode viver no dia a dia do "vale tudo"!

    Sei lá!Acho que me tornei pessimista com tudo isso que está por aí. Mas não consigo ver um futuro melhor, mais humano, mais ético!

    O que será de nossos netos? rsrs Só
    Deus sabe!

    Gde abç!
    Zinha

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  3. Princípios e valores ensina-se em casa. O meio e a vontade própria é que alteram isso, para o bem - evoluindo - ou para o mal. O que ocorre hoje é que os filhos da nossa geração tendem à ignorar a herança moral familiar e a vontade própria, pelo comodismo da inércia, tornando-se apenas frutos do meio. Temos de distribuir o seu texto, Figo, para nossos filhotes. Salve!

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  4. Ótima linha de pensamento: sensata, racional e alicerçada no princípio "causa-efeito".
    O que pasma nos cientistas sociais é justamente ignorar este princípio, portanto, jamais admitem que as mudanças sociais introduzidas por eles são as causas das mudanças ocorridas no comportamento humano.
    Abraço.
    cihgral.com

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